::entre mamonas e naylons

numa tarde de sol sem bengalas a torturar uma rua calçada, um menino sozinho, um estilingue, um gato e um revolverzinho vermelho e prata. um menino ainda sozinho. uma concentração agachada de quem aprendendo está a inventar outros que caibam, a principio numa vida inteira (nem que esta vida inteira padeça de vinte minutos apenas antes da mãe gritar um banho & bang-bang). o gato o esquece, não tem jeito. o estilingue apetece inércia de uma existência corrompida - e o menino o entende. um tiro e a surdez impactante do impulso. sonoplastias infantis convulsas percorrem as lembranças de dedos empunhados. a solidão e um corpo a distrair o tempo, gritar no ouvido dele e esconder até que aquele, cansado, se mande. eu mandava. mandava num mundo meu e em qualquer extensão que neste ousasse. aprendi cedo a mandar pra puta-que-pariu, encaminhava a ela vários e vários recônditos desagravos que amarguravam minha, até então, infância. apesar dos angustiantes segundos arrastados, que não me deixavam crescer, sofria-se em perder tempo com vazios intangíveis. aprendi cedo a descartar o que, com certeza, não me servia. [ainda não aprendi a ter certeza.] a mim é fácil o descolar-se de. : decolar ecos que só se repetem se eu gritar primeiro, como no quarto vazio dela - o surdo quarto de uma avó que lia lábios e de paredes que tinha ouvidos, imitavam-me. ela sorria e eu cerrava olhos como quem se esforça pra aprender a repetir, mas era sorriso. eu a repito. sem tentativas de. colo infâncias descascadas em meus dias hostis, colo cheiros de fruta, guarda roupas mistérios, colo os dias nublados, meu olhar enuviado e a lucidez que eu me postava, quando tempestades se encostavam em minha montanha. imito-me já que aquela lucidez nunca entendi, já que depois de mim nunca mais me alcancei. a mesma lucidez desse menino que inventa metáforas pro resto de uma vida, enquanto rabisca com gravetos um chão de areia e posta um revolverzinho no short de naylon. aprendi, como ele agora, a sonhar e a me defender do quê. "pra quê?"- me pergunto colocada de mim, enquando ando a me perder em revoadas memórias.uma esquina e eu me percebo sem meu revolverzinho."em que chão rabiscado eu o deixei?"

Um comentário:

Anônimo disse...

no quadro do Magritte, no centro da tela, não é o desenho de um cachimbo?